Está localizado no meio do tráfego rodoviário e aéreo, mas serão estes os sons que se destacam no jardim do Campo Grande? Uma investigação da NOVA FCSH dá pistas.
“Qual é o seu som preferido e porquê?” Esta foi a pergunta que Sandra Crespo Pereira colocou aos visitantes do jardim do Campo Grande, entre janeiro e junho de 2017. Como à época a zona sul do jardim estava em obras, a investigadora apenas recolheu e analisou as sonoridades do lado norte do espaço para a sua dissertação de mestrado em Ciências Musicais (2020) da NOVA FCSH.
O som dos pássaros foi a sonoridade que mais se destacou, mesmo com o ruído do trânsito: “Esta sonoridade continuou a ser a mais escolhida demonstrando possivelmente um desejo de a escutar”. Seguem-se o som do vento nas árvores e o silêncio, apesar de naquela zona ser praticamente impossível suspender o tráfego sonoro do trânsito, som que duas pessoas escolheram ser o seu preferido. Contudo, seis inquiridos não responderam à pergunta, alegando que não sabiam, não prestaram atenção ou que não tinham nenhum som preferido.
O canto dos pássaros foi eleito porque “a maioria das justificações se refere à sensação de quietude transmitida por esse som” por ser relaxante e transmitir tranquilidade. Além disso, é um som que remete para a natureza e “exclui” a cidade da equação, o que se “espera de ouvir num parque urbano”, respondeu um dos inquiridos.
Os restantes sons escolhidos, o vento nas folhas e o silêncio, remetem para as mesmas sensações de calma e tranquilidade. Porém, “o caso mais peculiar que recordo no decorrer deste projeto foi uma jovem que elegeu o som dos aviões como o seu preferido, esclarecendo que esse som a acalmava” porque a mãe já tinha sido hospedeira de bordo e a sonoridade remetia para a sua memória, explica Sandra Crespo Pereira.
Contudo, o ruído está sempre presente: “Percebi que, ao falar da atmosfera sonora de um local, o foco recai no ruído ou nos aspetos mais negativos, associados frequentemente a poluição sonora, ainda que a pergunta colocada pretendesse que os participantes focassem os elementos agradáveis desse ambiente”, acrescenta.
Outra sonoridade que se destaca na zona norte do jardim do Campo Grande são os campos de pádel, do clube desportivo Padel Campo Grande, quando não está encerrado. A manutenção do jardim, os estabelecimentos ou os espaços em redor também geravam sons acolhidos pelos visitantes. Porém, com a azáfama do trânsito e dos aviões a rasgarem o céu, há sons que só se conseguem ouvir esporadicamente: é o caso do sino da Igreja dos Santos Reis Magos, que a autora apenas conseguiu escutar quatro vezes durante o trabalho de campo, e o som dos pavões, no lado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.
Apesar disso, um dos sons que se mantém, explica Sandra Crespo Pereira, é o som dos remos dos barquinhos que existem no lago do jardim, principalmente quando há a Regata de Barquinhos, uma competição que acontece todos os anos no jardim. Também o OutJazz, evento musical, atrai participantes para o jardim, o que aumenta as sonoridades no local.
Ouvem-se ainda, quando há jogos de futebol no estádio José Alvalade XXI, os sons de “algumas roulottes de venda de comida de onde se escutavam música e relatos desportivos na rádio” e ainda os ruídos dos geradores.
O som é um dos elementos que podem influenciar a escolha de determinado espaço para frequentar. No caso do jardim do Campo Grande, com uma mão cheia de histórias através do tempo, atualmente o que motiva os utilizadores a frequentar este jardim são o lazer, o desporto, as atividades sociais, passear o cão ou simplesmente ser um local de passagem.
Fotografia: Lago no jardim do Campo Grande, fotografia retirada da dissertação da autora. Créditos: Sandra Crespo Pereira.
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