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Prisioneiros de guerra: um soldado lisboeta que enganou a morte duas vezes

Portugal assumiu a posição de neutralidade na Segunda Guerra Mundial, mas sabe-se hoje que centenas de portugueses entraram na guerra. Como? É o que um livro coordenado por um investigador da NOVA FCSH desvenda.

Ricardo Silva, investigador do Instituto de História Contemporânea (IHC) da NOVA FCSH, procurou os portugueses que lutaram na Frente Leste e, entre outros, encontrou José Esteves, soldado lisboeta que enganou a morte duas vezes. No capítulo que assina no livro “Prisioneiros de Guerras. Experiências de Cativeiro no século XX” (Tinta da China, 2019), coordenado por Pedro Aires de Oliveira, também investigador do IHC da NOVA FCSH, o autor explica como os portugueses lutaram ao lado do regime nazi.

Em 1941, a Espanha de Francisco Franco decidiu constituir um grupo de voluntários para combater na Frente Leste, depois de a União Soviética ser invadida pela Alemanha. Apesar de Salazar simpatizar com os regimes de direita, decidiu não seguir o exemplo do país vizinho, mas a decisão não impediu que meia centena de portugueses se alistasse em Espanha.

A Divisão Azul, nome pelo qual ficou conhecida a Divisão Espanhola de Voluntários devido à cor das camisas utilizadas pelos falangistas, aceitou José Alberto Rodrigues Esteves como soldado. Nascido a 9 de fevereiro de 1911, em Lisboa, cumpriu o serviço militar no Exército Português, mas mais tarde decidiu emigrar para Badajoz, em Espanha.

Na Divisão Azul cumpriu serviço durante pouco tempo, enganou a morte pela primeira vez e, no ano a seguir, voltou a alistar-se. A 10 de fevereiro de 1943, José Esteves testemunhou o cerco e os bombardeamentos em Estalinegrado. O português estava numa nas trincheiras da vila e presenciou o ataque que determinou a vitória da União Soviética.

José Esteves, única fotografia conhecida. Retirada da Visão História, 2013.

Milhares de soldados e civis morreram, mas José Esteves foi dos poucos que sobreviveram, enganando a morte mais uma vez. Foi capturado e mantido em cativeiro em Moscovo, junto de outros prisioneiros espanhóis. Ficou conhecido como o “El Portugués”, por ajudar os oficiais espanhóis da Divisão Azul que estavam isolados.

Só 11 anos depois, em março de 1954 – e após a morte de Estaline – é que os soviéticos concordaram em repatriar os prisioneiros de guerra, um acordo feito com a Cruz Vermelha. Das centenas de nomes que constavam nas listas, o nome do antigo soldado era um deles: “José Esteves voltou a Badajoz e recebeu apoio do Serviço Nacional de Ex-Combatentes, que lhe conseguiu arranjar um posto de trabalho provisório como guarda-florestal”. Contudo, o antigo soldado não ficou muito tempo neste trabalho e, lentamente, voltou a inserir-se na sociedade.

José Esteves não regressou a Lisboa e faleceu em 2003, aos 92 anos, em Badajoz. À época, era um dos poucos antigos prisioneiros vivos da Divisão Azul. Desta vez, a idade não lhe poupou a vida.

As investigações sobre a presença de portugueses na Segunda Guerra Mundial reunidas neste livro demonstram que houve soldados portugueses a participaram na Segunda Guerra Mundial e que Portugal era apenas neutro nas palavras de Salazar.

 

Fotografia de destaque: Funeral de um soldado português rodeado de soldados alemães. Créditos desconhecidos, mas retirado do blogue Letras Despidas.

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