A crítica musical, especialmente a clássica, ganhou uma função educativa com Francine Benoît, revela a investigadora Mariana Calado, que analisou os textos publicados no Diário de Lisboa entre 1924 e 1934.
Francine Benoît, professora, compositora e pianista, escreveu críticas musicais para o Diário de Lisboa durante 40 anos, entre as décadas de 1920 e de 1960, mas fez mais do que isso: demonstrou que a crítica pode ter uma função educativa.
A conclusão é de Mariana Carvalho Calado, investigadora no Centro de Estudos de Sociologia e Estética Musical (CESEM) da NOVA FCSH, que analisou as principais características das críticas musicais de Francine Benoît, publicadas no Diário de Lisboa durante os seus primeiros anos como colaboradora deste vespertino, entre 1924 e 1934. O seu primeiro texto, intitulado “O que deve caracterizar uma interpretação musical” foi publicado na edição de 11 de setembro de 1924, mas a estreia oficial de Francine como crítica de música aconteceria durante a temporada de ópera no teatro S. Luiz, diz a investigadora no artigo.
Logo na análise das primeiras críticas percebeu que havia um cuidado de Francine Benoît em escrever para ser lida por todos, talvez pela sua carreira como professora de música. “A educação musical da população era um assunto que lhe inspirava interesse e preocupações. Na linha de outros pensadores e pedagogos da época, considerava que a cultura musical se deveria fomentar desde a infância, tendo defendido em diversas ocasiões a importância de um bom ensino musical e de canto coral para a formação pessoal e social do indivíduo”, indica a investigadora.
Por defender uma educação musical, as suas críticas tinham uma linguagem leve, pouco especializada. A compositora utilizava metáforas como forma de exemplificar o que via e o que ouvia, analisava os intérpretes das obras, a sonoridade, as reações do público e, em recitais de ópera, ainda escrevia algumas notas sobre a cenografia. Quando era necessário, acrescentava apontamentos históricos sobre determinada peça.
“As características observadas em críticas de música de Francine Benoît permitem-nos enquadrá-las no princípio de que a crítica deverá ajudar o leitor a compreender as obras ouvidas e a apreciar ou descodificar o espectáculo de música. É uma posição que ela mesma considerava necessária e intrínseca ao papel da crítica musical”, escreve Mariana Carvalho Calado. Além disso, Francine Benoît tinha o cuidado de escrever críticas construtivas aos músicos ou atores que via representar, sugerindo melhorias.
O espaço que lhe era dedicado era muitas vezes aproveitado, tal como permite a própria estrutura da crónica, para abordar outros assuntos, como é o caso de uma das críticas a um concerto da Banda dos Bombeiros Municipais de Lisboa, em que Francine aplaude a gratuitidade da entrada e aproveita para alertar para a importância de peças de teatros ou outros espetáculos com preços mais acessíveis à população em geral.
Apesar de não ser possível avaliar de que forma o impacto destas crónicas pedagógicas teve nos leitores, mais especializados ou não, a investigadora defende que Francine Benoît introduziu os leitores do Diário de Lisboa a conceitos musicais e a obras de referência na áreas clássicas de forma acessível e educativa.
Fotografia de destaque: Francine Benoît no conservatório Nacional, em 1928. Créditos: Mário Novais
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